sábado, 13 de outubro de 2007

A Sinestesia dos Santos


Eu toco – e como não poderia chorar?
Minhas mãos tristes decidiram estar aqui e sou apenas extensão da vontade dessas gêmeas egoístas que me comunicam o mundo. Tudo escorre entre minhas dobras rústicas, que apalpam sem piedade a superfície do mundo, distinguindo sons e gostos e me fazendo suar ante a aspereza daquelas palavras, que chegaram através delas, das minhas mãos e, portanto, já alteradas pela rudeza do toque, que apanha o punhado de discurso e lança por terra, misturando na lama porosa antes de mergulhar nos meus ouvidos, discurso que vem da terra não é o mesmo discurso, mas prefiro que o argumento se perca a perder a textura do sentido – outro significado, outro sabor, mas menos insípido que as palavras nuas que me são dadas, como se eu fosse um pedinte de palavras!
Bem, não sou pedinte de palavras, sou sim de significados – e isto eu posso encontrar na sujeira da terra, misturo aquele discurso a ela então, e engulo some lama, sentindo, sentido, sentindo, posso gozar com o som das palavras em cascata, detritos que me revelam cores, que me revelam gostos, que me revelam cheiros e que em si não são nada além de fragmentos de uma realidade criada para entreter os cegos, os cegos de símbolos, que procuram o fato, não o signo que o contém, continuo tateando então, porque me recuso a sentir o mundo pelos olhos –onde o conjunto de formas se apresenta já dado, formas já acabadas, já mortas, por isso rasguei meus olhos, foi a primeira coisa que misturei à terra, a primeira coisa que engoli e escutei morrer em mim – e você não faz idéia doresultado... Eu tenho mágica faiscando pelas mãos e o mundo é grande, maior, bem maior que meu par de olhos manchados de sangue.